sábado, 24 de fevereiro de 2024

+ CIDADANIA: O centenário do Parque da Ponte

 

As efemérides pretendem evocar os acontecimentos memoráveis de uma determinada comunidade. Trata-se de um momento oportuno para valorizarmos uma determinada realidade, instituição ou personalidade. Neste ano de 2024, cumpre-se uma efeméride com particular significado para a cidade de Braga. Trata-se do centenário da conclusão do Parque da Ponte, uma iniciativa da edilidade bracarense, concretizada após a implantação da República, nos terrenos da antiga Quinta da Mitra.

Apesar da maioria dos bracarenses entender o Parque da Ponte como todo o espaço compreendido entre o rio Este - mais propriamente a avenida Francisco Pires Gonçalves – e o complexo desportivo onde se implanta o Estádio 1.º de Maio, o Pavilhão Flávio Sá Leite ou as Piscinas da Ponte, a verdade é que existem duas áreas distintas, até hoje separadas por um muro. Uma parte significativa do espaço arborizado que se encontra no entorno da Capela de São João da Ponte corresponde a uma área pertença da Confraria de São João da Ponte, cujos direitos transitaram para a Paróquia de Santo Adrião, após a sua extinção.

  Lugar fundamental para a realização da grande feira e romaria anual em honra de São João Baptista, foi-se tornando, a partir da segunda metade do século XIX, como um espaço de lazer da comunidade bracarense, tendo a Câmara Municipal de Braga colaborado na sua manutenção desde 1839, ano em que deliberou “autorizar o vereador Gaspar da Costa Pereira Vilhena Coutinho, a mandar fazer assentos de pedra no passeio de São João da Ponte” (Cf. Arquivo Municipal de Braga). Confirmando-se a utilidade pública daquele terreno, os serviços municipais foram continuamente tratando do seu embelezamento e conservação.

A outra área do Parque da Ponte, cujo centenário se assinala no presente ano, corresponde ao espaço nacionalizado pelo regime republicano, segundo o decreto datado de 15 de agosto de 1911, no qual é confirmada a cedência à Câmara Municipal da Braga, “da chamada Quinta da Mitra, sita em São João da Ponte para horto e parque Municipal”. Esta concessão foi feita a título provisório, obrigava a edilidade a pagar ao Estado uma renda, “enquanto durarem as funções administrativas e não for outra coisa definitivamente assente”. Estava formalmente autorizado o início das obras do tão ambicionado Parque da Ponte.

Delimitado por um muro, completado pelo gradeamento oitocentista - que pertenceu ao Passeio Público que existiu na Avenida Central, entre 1863 e 1914 – o Parque (municipal) da Ponte implantou-se nos terrenos da Quinta da Coutada, um lugar de veraneio que os arcebispos ali possuíam desde o século XV e que o arcebispo D. Gaspar de Bragança mandara murar na segunda metade do século XVIII (Peixoto, 1991). Dando resposta aos anseios da população em ter um parque da cidade, a Câmara Municipal constituiria uma comissão que tinha como missão dar andamento ao processo de construção do parque.

Constituída por homens influentes na comunidade bracarense como Júlio de Amorim Lima, António Fernandes de Araújo, Augusto Costa, José do Egipto Palha e Augusto Veloso, esta comissão haveria de fomentar o desenvolvimento do recinto como espaço de lazer. Esta mesma Comissão haveria de constituir-se como Empresa do Parque da Ponte, e durante quase três décadas foi responsável pela administração do recinto, por delegação municipal.

O projeto, da autoria de José Pedro da Costa, previa a construção de um grande lago centralizando as áreas ajardinadas, aproveitando-se a fonte quinhentista ali implantada, bem como a antiga residência dos arcebispos, onde se previa instalar-se um casino. A obra seria iniciada em 1914, ano em que a parcela de terreno mais elevada seria transformada num hipódromo, no exato lugar onde três décadas mais tarde viria a surgir o Estádio 28 de maio. Três anos mais tarde, em 1917, foram alienadas novas parcelas de terreno para permitir a construção do horto municipal.

Em 1922 sucederia a inauguração do Hipódromo Amorim Lima, que era citado à época como um dos melhores do país e estreado nas Festas de São João desse ano. Dois anos depois, em 1924, seria terminado o grande lago, concluindo-se formalmente a empreitada do Parque da Ponte, que seria um dos destaques do Almanaque-Anuário de Braga, publicado nesse ano, que o catalogava como “novo Éden” e “mais lindo e ridente jardim do Minho”.

                A evocação do centenário daquele que continua a ser o único parque da cidade constitui-se como singular oportunidade, não apenas para a sua justificada celebração e reconhecimento, mas também para a imperativa premência de criação de novos parques verdes na densa malha urbana bracarense.

 

 

Rui Ferreira

Presidente da Direção da Braga Mais

+ CIDADANIA: A Arte da Talha

 

Correio do Minho, 27/01/2024

sábado, 30 de dezembro de 2023

+ CIDADANIA: Réquiem pelo Museu da Imagem

 


A palavra “réquiem” provém do vocábulo latino “requiem”, uma derivação de “requies”, que significa descanso ou repouso. Este termo designa habitualmente as celebrações cristãs realizadas em homenagem aos defuntos. O nosso propósito é, por conseguinte, prestar homenagem a um espaço cultural de enorme mérito, que subsistiu na nossa comunidade ao longo de mais de 20 anos.

O Museu da Imagem foi um espaço cultural, que nasceu no edifício da antiga farmácia Alvim e num antigo torreão da fortificação medieval contíguo, inaugurado a 25 de abril de 1999, destinado à realização de exposições de fotografia e à conservação e inventariação dos arquivos fotográficos das antigas casas de fotografia Aliança e Pelicano.

Este equipamento cultural, realizado por iniciativa dos executivos liderados por Francisco Mesquita Machado, inseria-se numa particular dinâmica que a cidade e os seus agentes culturais foram gerando em torno da fotografia, e que confirmariam Braga como um dos principais lugares da Imagem em Portugal.

Ao longo de quase década e meia, o técnico-superior do Museu da Imagem foi Rui Prata, desenhando uma programação meritória, que conciliava a fotografia contemporânea – destacando-se particularmente os Encontros da Imagem - com a inventariação progressiva do espólio fotográfico, através da realização de exposições e da publicação dos respetivos catálogos. Desde 2013 que o edifício revelava diversas fragilidades ao nível das coberturas e do isolamento, tendo até sido colocado em risco a conservação do seu espólio fotográfico, como seria oportunamente denunciado pela investigadora Catarina Miranda Basso.

Apesar do vereador responsável pelo Pelouro da Cultura, entre 2013 e 2021, continuamente inserir como prioridade do seu plano anual de atividades a empreitada de reabilitação do Museu da Imagem, também incessantemente esse desiderato era barrado no gabinete-mor da edilidade. Aquele espaço museológico permaneceria aberto até ao derradeiro trimestre de 2019, momento em que as infiltrações e as condições de segurança já não permitiam que continuasse em atividade. Desde essa data permanece encerrado, sem data prevista para reabrir.

Todos os anos, por ocasião da discussão das Grandes Opções do Plano, é notícia o presumível investimento da Câmara Municipal de Braga no Museu da Imagem, mas todos os anos também não é iniciado qualquer procedimento concursal nesse sentido, como, aliás, vai sucedendo com a musealização da Ínsula das Carvalheiras ou da Estação Arqueológica de Santa Marta das Cortiças, entre outros.

Entretanto, logo após as restrições provocadas pela pandemia de covid 19, também a Torre de Menagem encerraria ao público, supostamente devido à necessidade de substituição de vigas madeira de alguns degraus interiores, desperdiçando-se a exposição permanente sobre a história da cidade de Braga, ali instalada desde 2017. Uma empreitada demasiado simples e módica para justificar três anos de encerramento.

Recentemente também a Casa dos Crivos, única galeria municipal, encerraria as suas portas, mais uma vez para serem realizadas obras de reabilitação. Terá o mesmo destino que o Museu da Imagem? Como é possível que os três espaços de exposição geridos pela Divisão de Cultura da Câmara Municipal de Braga estejam encerrados em simultâneo? Quão grande é a apatia e alheamento da sociedade civil e dos partidos políticos quanto à realidade da nossa cidade?

Considerando os adiamentos contínuos da empreitada de reabilitação do Museu da Imagem, aliado ao facto de, no presente mandato, a pasta da Cultura ser da responsabilidade do principal agente pelo seu encerramento, podemos concluir que dificilmente a situação se alterará.

A deliberação que se vai entrevendo é, certamente, mais um motivo para justificar por que Braga não foi escolhida para ser a próxima sede portuguesa da Capital Europeia da Cultura. Uma cidade que ostensivamente encerra os seus espaços culturais, ou que desperdiça equipamentos adquiridos com essa finalidade, para nele ser edificada uma residência universitária, não merece tal distinção.

Perante os indícios que nos têm sido continuamente oferecidos pela Câmara Municipal de Braga, não nos resta outra alternativa senão agradecer todos os contributos que foram oferecidos pelo Museu da Imagem à dinâmica cultural da cidade de Braga, ao longo de duas décadas, e celebrarmos um Réquiem por mais um espaço cultural bracarense. R. I. P.

 

 Rui Ferreira

Presidente da Direção da Braga Mais

+ CIDADANIA: Feira Popular de Braga

Correio do Minho, 02/12/2023
 

sábado, 9 de dezembro de 2023

+Património: Percurso Solidário Natalício

As associações Braga + e JovemCoop organizam, no próximo sábado, dia 16 de Dezembro, mais um percurso pelo património bracarense, desta feita procurando fazer a história do culto de Nossa Senhora da Conceição na cidade de Braga. O objetivo desta visita guiada é mergulhar no espírito natalício através de uma das narrativas mais discutidas da história da Igreja Católica.A iniciativa tem início marcado para as 10h00, no largo da Senhora-a-Branca.

A chegada dos franciscanos à cidade de Braga em 1523 haveria de precipitar uma progressiva implantação deste culto. Primeiro no convento dos Capuchos da Piedade em S. Jerónimo de Real, no século seguinte com a fundação de um convento de inspiração franciscana denominado “da Conceição” e, na mesma centúria, com a edificação da Igreja dos Terceiros. Ao mesmo tempo, em diversos espaços de culto ia sendo instaurada a devoção “nacional”. 

Na ancestral porta medieval de Santiago haveria de surgir o mais relevante núcleo devocional de Nossa Senhora da Conceição, cuja imagem haveria de ser declarada padroeira da cidade em meados do século XVIII. 

A Capela do Paço do Arcebispo, edificada no início do século XVIII, também iria adotar como padroeira de Nossa Senhora da Conceição. No mesmo período é fundado o convento da Penha de França, devotado à mesma invocação.

A fundação do santuário do Sameiro a partir de 1863 haveria de confirmar esta especial predileção bracarense pela devoção a Nossa Senhora da Conceição.

A visita guiada irá permitir observar alguns destes espaços, contando com passagens pelo oratório da Senhora da Torre, Igreja da Conceição e Igreja da Penha de França. 

Esta iniciativa tem um teor solidário, já que os participantes serão convidados a trazer uma (ou mais) garrafa de azeite, que será posteriormente doada à Comissão Social de S. Victor com o escopo de compor os cabazes de Natal que são entregues às famílias mais carenciadas. Trata-se de uma forma das associações se agregarem à Missão Põe Azeite, que tem sido levada a cabo pelo Grupo Coral de Guadalupe.

terça-feira, 28 de novembro de 2023

MEMÓRIAS DE BRAGA: antigo Cinema São Geraldo

 


Associação Braga Mais promove no próximo dia 7 de dezembro, pelas 21h15, mais uma sessão do ciclo Memórias de Braga, que se vai debruçar sobre o antigo Cinema São Geraldo, emblemática sala de espetáculos bracarense, que funcionou entre 1950 e 1990.

Esta sessão evocativa, que se realiza no Museu do Traje Dr. Gonçalo Sampaio, terá como convidados Luís Tarroso Gomesum dos mentores do movimento cívico “São Geraldo Cultural”, e também do ator e encenador José Miguel Braga, contando com moderação de Rui Ferreira.

O velho cinema São Geraldo, que abriu as portas no dia 1 de junho de 1950 como a primeira sala exclusivamente destinada à sétima arte na cidade de Braga, nasceu no mesmo edifício do antigo Salão Recreativo Bracarense, fundado em 1924 nos terrenos do antigo Convento dos Remédios. Trata-se de uma iniciativa do padre Manuel Ribeiro Braga, sob projeto de Bernardo José de Lima, que ficaria ao serviço dos operários católicos, onde decorriam conferências, recitais, exposições, sessões cinematográficas, banquetes, bailes e festas.

Reconvertido numa sala de cinema, funcionaria com essa missão durante quatro décadas, entre 1950 e 1990, tendo voltado a funcionar temporariamente, enquanto decorriam as obras de reabilitação dos cinemas Avenida.

Salvo recentemente de um empreendimento imobiliário, que iria promover a sua destruição, graças à mobilização dos cidadãos bracarenses através da plataforma São Geraldo Cultural, o edifício tem previsto ser transformado num Centro de Media Arts pela Câmara Municipal de Braga.

Como vem sendo habitual, durante a sessão estará exposta uma pequena mostra de documentos e fotografias recolhidos por Fernando Mendes, que complementam a informação que será abordada nesta sessão.

Recorde-se que o ciclo Memórias de Braga realiza-se, com constância trimestral. Cada conversa, que se quer informal, anda à volta de um ou mais convidados. O objetivo é mesmo o de conversar, público e convidados, no sentido de partilhar e construir memórias sobre a cidade.

 

sábado, 4 de novembro de 2023

+ CIDADANIA: Braga brasileira

A cidade de Braga destaca-se atualmente como o principal lugar de acolhimento de brasileiros em Portugal. O surto migratório, iniciado há quase uma década, fez crescer exponencialmente a presença da população proveniente do Brasil na urbe bracarense, acreditando-se que possa corresponder a quase 8% do total da população urbana.

Segundo os números oficiais, no concelho de Braga conta-se 7 774 imigrantes oriundos do Brasil. No entanto, segundo a autarquia e as associações de acolhimento esse número pode corresponder ao dobro.

Esta presença tão significativa de brasileiros na cidade de Braga tem alterado a sua fisionomia e redesenhado os ritmos do quotidiano. Esta transformação tão acelerada, como qualquer outra mudança, tem provocado reações díspares na comunidade bracarense. A generalidade da população tem manifestado um acolhimento exemplar, todavia existe uma minoria que tem expressado desagrado e, até, alguma agressividade.

A verdade é que esta tão assertiva presença da comunidade brasileira tem provocado transformações muito positivas na nossa cidade. Além da revitalização urbana potenciada pela ocupação de apartamentos constantemente vazios ou pela criação de negócios em espaços comerciais outrora devolutos, estes novos bracarenses têm-se demarcado pelo seu entusiasmo pela mundividência bracarense.

Os bracarenses brasileiros, permitam-me assim chamá-los, não têm sido apenas responsáveis pela dinamização da economia da cidade, mas manifestam um expressivo afeto pela identidade braguesa. Esta paixão tem-se revelado na apropriação crescente dos espaços urbanos, como as praças das urbanizações em que residem e até do olvidado Parque da Ponte, mas também numa intensa participação nos grandes momentos da nossa vida coletiva, de que a Semana Santa e as Festas de São João são a expressão mais significativa, contudo também revelada na inauguração de novas expressões de religiosidade e, até, no crescimento de associados do Sporting Clube de Braga. 

Porém, não se pense que este vínculo de Braga ao Brasil detém apenas uma década de existência. A ligação histórica da comunidade bracarense com a antiga Terra de Vera Cruz revela uma particular ancestralidade. Basta recordar que é em Braga, mais precisamente no Tesouro-Museu da Sé, que se guarda a cruz que presidiu à primeira missa celebrada em solo brasileiro. Foi desde Braga, e do seu entorno geográfico, que partiram muitos dos artistas que construíram o barroco de Minas Gerais. Como não recordar o Bom Jesus de Congonhas, que procurou replicar o nosso Bom Jesus do Monte? Este intercâmbio cultural ficaria também patente nos festejos sanjoaninos bracarenses, apelidados em meados do século XVIII como o “Brasil da cidade”.

Seria ainda devido ao empreendedorismo e capital financeiro dos “torna-viagem” que a cidade mergulharia num surto desenvolvimento decisivo na segunda metade do século XIX, tendo estado até na origem da fundação do Banco do Minho. Quantos bracarenses não se lembram ainda de nomes como Miguel José Raio, Joaquim Machado Caires ou do Conde de Agrolongo, cuja ação continua gravada na fisionomia da cidade? 

Esta grande comunidade proveniente do outro lado do Atlântico tornou a cidade de Braga mais alegre, espontânea e bem-disposta, concedendo nova vida a urbanizações anteriormente decadentes, trazendo movimento e dinâmica às nossas ruas ou ajudando a valorizar os principais traços da nossa identidade coletiva.

A nossa cidade hoje já não se limita a dançar o vira ou o malhão, mas agita-se também ao ritmo do samba ou do frevo. À hospitalidade e alegria tão típicas do povo minhoto, associamos também a excitação, o ruído e o sorriso espontâneo daqueles que se deixaram deslumbrar pela nossa forma de ser. Esta Braga brasileira, também conhecida como “Bragasil”, tem, efetivamente, potenciado o melhor de nós.

Será possível não nos deixarmos entusiasmar com tão proveitosa presença?

 

 

Rui Ferreira

Presidente da Direção da Braga Mais